domingo, 23 de julho de 2006

RP tem falta de creches desde 1998


Nicola Tornatore

A Promotoria da Infância e Juventude do Ministério Público Estadual em Ribeirão Preto inicia nos próximos dias uma série de audiências com o objetivo de tentar solucionar um problema que aflige centenas de famílias, principalmente em bairros da periferia da cidade: a falta de vagas em creches públicas ou filantrópicas.

O presidente da Fabarp (Federação das Associações de Bairro de Ribeirão Preto), Eurípedes Ignácio dos Reis, destaca que a inexistência de vagas é uma das mais freqüentes reclamações de associações de moradores.

“As queixas vêm com maior intensidade de famílias que moram em bairros da periferia, como o Jardim Aeroporto, o Parque Cândido Portinari, o Jardim Orestes Lopes de Camargo, a Vila Recreio e o Parque dos Flamboyans, entre outros”, destaca. “A Fabarp acompanha as ações da administração municipal e sabemos que a Prefeitura tem construído novas unidades e ampliado creches já existentes, mas a verdade é que não deu ainda para suprir a demanda”, comenta.

No Ministério Público existem procedimentos relativos à falta de vagas em creches abertos desde 1998. “Até hoje, quando surge alguma queixa de munícipe, tentamos resolver o problema, mas o esforço tem sido caso-a-caso. Agora estamos em busca de uma solução global, para todos a cidade”, explica Marcelo Pedroso Goulart, promotor da Infância e Juventude.

“A nossa grande dificuldade sempre foi quantificar o problema, identificar a real demanda. Por lei, toda criança de zero a seis anos tem direito a uma vaga em creche, mas não são todas os pais que têm interesse em colocar seus filhos em creches”, explica. O MP chegou a solicitar um estudo a um especialista em educação da USP, mas não foi o suficiente.

“Agora idealizamos um outro processo. Vamos convocar todas as associações de moradores e solicitar que elas, em seus bairros, levantem o número de vagas necessárias”, explica Goulart. “Isso pode ser feito, por exemplo, a partir das listas de espera que praticamente toda creche mantém”. A primeira audiência, na próxima quinta-feira, dia 27, reunirá representantes das creches filantrópicas.

Associações de moradores que por ventura não receberam a convocação do MP podem entrar em contato com Gosuen pelo telefone (16) 3629-3848.

Existem 111 associações de bairro cadastradas na Fabarp, mas a própria federação estima em 170 as entidades do gênero existentes em Ribeirão Preto.

EM ANÁLISE

Levantamento poderá subsidiar ação contra a Prefeitura

O levantamento para identificar quantas vagas em creches são necessárias para atender toda a demanda existente em RP vai subsidiar uma ação civil do Ministério Público contra a Prefeitura. “De posse desse levantamento, vamos primeiro solicitar à Prefeitura que providencie as vagas necessárias. Caso a administração não atenda ao pedido, aí devemos ingressar com uma ação civil pública”, explica o promotor Marcelo Pedroso Goulart.

No passado, o MP já acionou a Prefeitura num caso semelhante. “Pedíamos vagas em creches para famílias moradoras do Parque Ribeirão e da Vila Virgínia. Perdemos no Tribunal de Justiça de São Paulo, numa decisão absolutamente contrária ao que estabelece a Constituição Federal. Mas recentemente o Superior Tribunal de Justiça emitiu sentença, em ação semelhante, reconhecendo a obrigação do Poder Público em oferecer vagas em creches a todas as famílias”, explica. Segundo o MP, a obrigatoriedade do Poder Público em garantir vagas em creches para crianças de zero a seis anos consta não só da Constituição Federal mas também da LDB (Lei de Diretrizes Básicas da Educação) e no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).

Prefeitura possui 20 unidades próprias

A Secretaria Municipal da Educação possui vinte creches, sem contar as conveniadas. Chamada de CEI (Centro de Educação Infantil), elas atendem crianças de zero a três anos. Outras três unidades estão em construção - uma no Jardim Guanabara (próximo da Vila Virgínia), outra no Jardim Heitor Rigon e a terceira no Ribeirão Verde.

Já as crianças de quatro a seis anos são atendidas em 32 estabelecimentos de pré-escola, batizados de Emei (Escola Municipal de Educação Infantil). A Prefeitura está construindo mais duas (no Jardim Silvio Passalacqua e no Jardim Heitor Rigon) e ampliando a unidade do Jardim Aeroporto.

Tanto nas CEI’s quanto nas Emei’s o preenchimento das vagas é por idade - o local de moradia não é determinante. “Em princípio, a prioridade é para os mais velhos, já que são estes que estão mais próximos de entrar no Ensino Fundamental”, explica Alessandra Armelino, supervisora de Ensino da Secretaria Municipal da Educação.

Segundo Alessandra, não existe um levantamento preciso do número de vagas que seriam necessárias para atender toda a demanda das famílias. Ela não usa o termo “lista de espera”, mas sim cadastro. “Toda unidade tem o seu cadastro. Mas muitas famílias cadastram os filhos em mais de uma unidade, e por isso o simples cruzamento dos dados não revela a realidade da demanda”, explica.

Além da prioridade às crianças mais velhas no preenchimento da vagas existentes, a Secretaria da Educação também leva em conta a situação social da família em questão. “Muitas vezes um Conselho Tutelar ou a própria Promotoria da Infância e Juventude pleiteiam diretamente uma vaga para uma criança em situação de risco social., Nesses casos, damos prioridade a esses pedidos”, explica Alessandra Armelino.

Bairro tem três creches, todas lotadas

A existência de creches municipais num bairro não é garantia de que as famílias que ali moram vão dispor de vagas para seus filhos.

O melhor exemplo dessa realidade é a Vila Recreio, bairro próximo ao populoso Ipiranga, na região oeste da cidade. Na Vila Recreio, a Secretaria Municipal da Educação mantém nada menos que três CEI’s (Centro de Educação Infantil): as creches “Jesus de Nazaré” (rua Tupinambá, 550), “Dom Mieli” (rua Tupinambá, 1457) e “Ana Ignez de Carvalho Gouveia” (rua Guaporé, 1449).

Apesar da “fartura” de creches, o presidente da Associação de Moradores da Vila Recreio, Hélio Ferreira, ao ser indagado sobre quais as principais reivindicações do bairro, não titubeia - ao lado do pedido de mais médicos para a Unidade Básica de Saúde, ele reivindica mais vagas nas creches municipais.

Segundo Ferreira, existe na Vila Recreio um grande número de mães de famílias que gostariam - e precisam - de trabalhar fora, mas não podem procurar emprego por não disporem de local para deixar as crianças menores de seis anos.

A inexistência de vagas naquelas creches decorre da estratégia oficial de priorizar o preenchimento das vagas pela idade da criança, e não pelo local de moradia da família. Ou seja, boa parte das vagas naquelas três creches é ocupada por crianças moradoras de outros bairros que não a Vila Recreio.

A Secretaria Municipal da Educação possui creches municipais (CEI’s) nos seguintes bairros: Antonio Marincek, Alexandre Balbo, Jardim Branca Salles, Monte Alegre, Jardim Novo Mundo, Quintino Facci I, Jardim Presidente Dutra II, Jardim Roberto Benedetti (conjunto dos Bancários), Planalto Verde, Valentina Figueiredo, Dom Mieli, Quintino Facci II, Adelino Simioni, Vila Abranches, José Sampaio, Parque Ribeirão Preto e Vila Virgínia, além do distrito de Bonfim Paulista.

Fonte: Jornal A Cidade, 23/07/2006, Ano: 101 Número: 169